Mauro Andrade Moura
Tenho lido nesses últimos dias aqui na Vila de Utopia a respeito da falta de uma política de desenvolvimento econômico em nossa Itabira, após o anúncio da mineradora de que o minério aqui só durará até 2028.
Para mim isto não é estranho. A Vale já anunciava já há um bom tempo que esse futuro acontecimento está prestes a acontecer e que é preciso se preparar para esse fim inexorável. Bem antes, o meu pai, Aníbal Moura, foi extremamente desmerecido em nossa sociedade, aquela mesma que caiu de quatro com o advento da II Guerra e deixou todos sem rumo quanto aos seus negócios e às suas vidas.
Há pouco mais de duas décadas foi criada a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, nesse traço, foi criado o Fundo Municipal de Desenvolvimento Econômico e Social de Itabira (Fundesi), já prevendo exatamente a extinção da mineração em 2025. Onde, portanto, está a novidade que teria sido escondida do itabirano?
Muito dinheiro público investido e mais ainda mal gerido, ao ponto de até mesmo o atual secretário municipal de Fazenda, Marcos Alvarenga, que praticamente participou de todo esse processo, não consegue dar uma resposta plausível quando indagado para saber qual foi o montante de dinheiro do Fundesi emprestado, quais são os tomadores, quem pagou e quantos e quem são os muitos que não pagaram. Afinal, quanto o município tem a receber dessas empresas financiadas a juros subsidiados e que estão dando calote no Fundesi?
Um silêncio sepulcral se faz na cidadezinha. A Acita, a associação comercial dos empresários, que congrega, com certeza, muitos desses caloteiros, nada diz como se o tema não fosse com ela, embora diz ser a vanguarda do desenvolvimento, sempre prometido, mas que nunca ocorre. Promove seminários e mais debates em workshop que consome mais recursos públicos, puro marketing para gáudio de poucos que realmente lucram com todo esse blablabá de 40 anos atrás.
Nesses espaços quando se fala em inovação, me dá vontade de sacar a minha garrucha de dois canos, uma bem enferrujada fabricada nas forjas do Jirau, igual a que matou muitos índios guaranis no genocídio do Paraguai.
Agora vem o governo municipal dizendo que irá instituir um grupo de estudos para debater as alternativas econômicas de Itabira, uma novidade com cheiro de naftalina. Sem cismar a priori com a derrota incomparável, mas já cismando, vejo nisso a repetição da velhíssima conversa do passado, e que certamente irá encher as burras de notórios consultores às custas de erário municipal.
Pois bem mal, voltando ao assunto desta pauta. Esse desvio de dinheiro dos cofres municipais tem ocasionado um outro problema relevante e grave em nossa cidade. Com o recorrente discurso da crise, que sabemos já ter sido em boa parte mitigada com o aumento dos royalties e com a arrecadação do ICMS que também advém do minério, os administradores vem a cada dia diminuindo os já parcos recursos para o desenvolvimento cultural, que é também econômico.
A Fundação Cultural Carlos Drummond de Andrade (coitado do Poeta), que tem o cariz de Secretaria de Cultura, pouco faz para o desenvolvimento cultural – e muito menos dá conta de suas obrigações naturais.
Não abre o debate com a comunidade para discutir novos caminhos – e muito menos informa o quanto realmente tem para o trato com um mínimo que seja como parte do programa de governo para o desenvolvimento cultural e para a sua manutenção.
Por ocasião da criação do Conselho Municipal de Política Cultural (já nem me lembro a data e muito menos vi a Fundação Cultural Carlos Drummond de Andrade respeitar as decisões acertadas pelas deliberações em plenário), eu disse a alguns dos participantes que eles estavam muito preocupados com o Fundo Municipal de Cultura, enquanto a Lei Drummond de Incentivo à Cultura ficava relegada ao décimo plano.
Pois bem, aí está o resultado. Como o administrador municipal, vulgo prefeito, não repassa do polpudo orçamento da Prefeitura uma quantia mínima, algo em torno de um mísero 1% do que arrecada em impostos, ao Fundo Municipal de Cultura. Trata-se de uma obrigação legal que vem sendo sistematicamente desrespeitada, um claro ato de ilegalidade que deveria, de ofício, ser investigado pelo Ministério Público. E o alcaide da cidade não autoriza o secretário da Fazenda fazer o repasse devido à cultura. A prioridade é construir outras avenidas.
E a superintendente Martha Mouzinho se emudece, como se não fosse seu papel exigir do prefeito que cumpra o que está na lei. Acaba também sendo cúmplice de prevaricação, por não cumprir o que está na lei, não obstante o poder e missão que advém do cargo que ocupa. Em mais esse caso o silêncio é sepulcral.
Nos últimos cinco anos, a Prefeitura de Itabira só disponibilizou a miséria de R$ 50 mil ao Fundo Municipal de Cultura. E já lá vai para o terceiro ano consecutivo que não é aberto o edital público para projetos culturais que deveriam, ou poderiam, ser patrocinados pela Lei Drummond.
Não bastasse tudo isto, ainda tem-se a discrepância de não abrir concurso público para o preenchimento de cargos, sendo que o último realizado pela fundação foi em 1996. Sem cumprir mais uma vez o que determina a lei, preenche esses cargos com os apaniguados, os apadrinhados dos vereadores da sempre cordata bancada situacionista e fisiologista, que tudo aprova em troca de cargos e outras vantagens certamente inconfessáveis. É uma clara e descarada cooptação por parte do poder executivo dos servis vereadores, com pouquíssimas exceções.
Tudo isso são discrepâncias da falta que faz uma política cultural com diretrizes bem definidas em lei, após exaustivamente debatidas com os diferentes segmentos culturais e produtores de cultura no município. Sem isso, perde-se no expontaneismo, ficando à mercê de produtores de “enlatados” que fazem do palco da casa da cultura um espaço menor para peças e shows de nível cultural bastante duvidoso, de quinta categoria.
É uma discrepância com o seu objetivo mínimo de elevar a cultura itabirana, propiciando espetáculos de qualidade, de alto nível e que leve a massa ignara a um dia, quem sabe, consumir do “biscoito fino” a que se referia Oswald de Andrade (1890/1954).
Isso só ocorre pelo fato de a administração não se ter ainda um plano efetivo de desenvolvimento cultural parra Itabira. Sem esse plano e o respeito à cultura, sem uma lei que o defina, a política cultural, se é que assim pode ser chamada, permanecerá à mercê dos devaneios pessoais dos administradores municipais e também dos próximos gestores da Fundação Cultural Carlos Drummond de Andrade. Mais uma vez a vontade que me dá é de sacar a minha garrucha de dois canos fabricada no Jirau.
14 Comentários
Belo texto , concordo com essa verdade
Muito bem, grato pela leitura.
Mauro, a imagem de uma garrucha enferrujada que na prática não atira, tem um sentido muito profundo comparada com a realidade da cultura em Itabira retratada com toda a clareza e indignação no seu texto.´E mais fácil sair tiros da sua dois canos do que desenferrujar a mente cultural desses administradores citados por você. É lamentável, Itabira merece coisa melhor.
Um abraço,
Moisés!
Muito bem, Moisés.
Já vivemos dias melhores em nossa difusão cultural e ultimamente todos os artistas e ativistas estão parecendo rastejar em busca de uma leve brisa a respirar e suspirar por tempos mais alvissareiros.
Meu saudoso e centenário pai bem dizia que aqui é terra de nanicos mentais, comprovando mais uma vez suas sábias palavras.
Grato pela leitura e a garrucha enferrujada está disponível a todos que queiram fazer bom uso dela.
Saudações,
Mauro
Parafraseando: “minha arma está armada e apontada para a cara do suspeito!” A imagem é nítida e faz o que deveria ser feito. A vontade de disparar a garrucha enferrujada só jirau, coça os meus dedos
Ó Eduardo, mais uma vez suas fotografias completaram soberbamente o simples texto e para melhor entendimento de todos, mesmo que seja subliminarmente.
A garrucha enferrujada do Jirau está disponível a todos que queira fazer um bom uso dela.
Grato,
Mauro
O texto para eclipsar a lua e sua arma apontada, bem que poderia ser a sua alma.
Minha Alma (A Paz Que Eu Não Quero)
O Rappa
A minha alma tá armada
E apontada para a cara
Do sossego
Pois paz sem voz, Paz sem voz
Não é paz é medo
Às vezes eu falo com a vida
Às vezes é ela quem diz
Qual a paz que eu não quero
Conservar
Para tentar ser feliz (x4)
As grades do condomínio
São para trazer proteção
Mas também trazem a dúvida
Se é você que está nessa prisão
Me abrace e me dê um beijo
Faça um filho comigo
Mas não me deixe sentar na poltrona no dia de domingo,
Domingo
Procurando novas drogas de aluguel
Nesse vídeo coagido
É pela paz que eu não quero seguir admitindo
É pela paz que eu não quero, seguir
É pela paz que eu não quero, seguir
É pela paz que eu não quero, seguir
Admitindo
Esse texto tem DNA.
Então meu caro, Fernandinho.
Ando evitando entrar em detalhes e em escritas a respeito do desmazelo desta atual e bem paga administração municipal.
Porém, devido ao fato do mau atendimento a um amigo e artista na recepção (seria melhor decepção) da aFundação Cultural e à péssima curadoria do nosso Festival de Inverno (alguém já sugeriu festival de inferno), não há mais como me conter ou me manter alheio a tudo isto de ruim que vêm fazendo conosco e sempre com desculpas rasteiras e explicações rasas da real situação dos cofres públicos municipais.
Obrigado.
Será que algum dia lerei uma crônica como o título de “AMERICA LATINA NA GUILHOTINA”?
(vejo que tudo não passa de um tratamemento colonialista para com esta parte do mundo)
Não percebo nenhuma nação se despontar (ou que esteja nesta direção) como potencia mundial.
Sei que vou morrer sem ver isso,
Thanks.
JRM
Meu amigo Veladimir Romano outro dia escreveu a respeito disto mesmo no Vila de Utopia com o que vem sempre acontecendo na América Central.
Eu envei-lhe a crônica dele.
Boa leitura,
Mauro
Primeiramente, Lula Livre! e Lula Livro!
Querido Mauro, excelente artigo e bem editado. Também louvo o Eduardo Cruz, pelas divinas fotos.
O ouro, o minério e as esmeraldas de Itabira, toda essa riqueza ficou entre os clãs caçadores de ouro,
desbravadores implacáveis da Matto à Dentro, “a sociedade de elite,com suas raízes agrárias e caráter municpal estava plenamente formada por volta de 1850. Tendo efetuado a transição de uma economia de mineração para agropecuária, Minas desenvolveu a ordem social centrada no clã…fechados por laços de parentesco.*”
A política cultural do FCCDA foi construída pela elite para a elite promover seus projetos e se empregar. E veja o resultado na Avenida Carlos de Paulo Andrade, violentaram a arquitetura do prédio do Centro Cultural…, interferências ruins e desrespeitosas com a criação de arquitetos e projetistas que o idealizaram. E por dentro, não tem o diverso, não tem as outras classes. Falta oxigênio, outras ideias. Falta a periferia. Falta entender e separar o público do privada e do religioso (a imagem de uma santa no Poço da Água Santa, perigosa pelo desrespeito com o que é Publico). Sociedade de pensamento e espirito provinciano do século 18.
O burro chamado Brasil quebrou o pescoço por Irresponsabilidade e velhacaria e está atolada no buraco do Cauê. A Cabeça de Burro no Buraco e a Serpente no Rosarinho.
Deu ruim, Mauro, e saque a sua garrucha de dois canos fabricada no Jirau. E meu abraço pela sua valiosa presença na Vila, aliás entendo que vc é o mais importante colunista desta Revista de Utopias.
*(John D. Wirth).
Ótimo texto prezado colunista . Aproveito o ensejo para perguntar-lhe : Será que os trabalhadores da cultura itabirana , podem ter alguma esperança de que ainda neste segundo semestre , poderá a FCCDA abrir algum edital para apresentação de projetos culturais , lei Drummond ou mesmo o fundo municipal de cultura ? Um abraço e parabéns pelo excelente texto .
Gostei do assunto de sua publicação, gostaria de ver se é pertinente de divulgar em meu site: link acima.
Sds.
Hermes