Joaquim Falcão*
É fogo de indignação. O Museu Nacional está ardendo. Ardendo de raiva.
Não precisa mais chamar os bombeiros. Não precisa mais que as autoridades procurem a causa do horror.
Todos conhecemos a causa. É visível em seu início e trágica em seu fim. É uma cadeia.
Não precisa chamar os Ministros da Cultura para lamentar.
Chamem logo os Ministros da Fazenda, os Ministros do Planejamento o Congresso, os responsáveis pelos orçamentos destes anos todos.
Não se contabiliza, não se corrige, não se ajusta por índice algum, os tesouros da cultura brasileira. Nosso patrimônio cultural inexiste para a política econômica e financeira. Não entra em seus cálculos. É um nada.
Basta simples análise contábil. Vejam quanto foi destinado aos museus nacionais nestes anos todos. Retirem as despesas com pessoal, verifiquem as despesas de manutenção. Deduzam tudo e a verdade aparece.
Quanto investimos no aperfeiçoamento de nossos recursos humanos em nossos funcionários? Em novos processos gerenciais. Quanto investimos na modernização tecnológica de nossas instalações museológicas e científicas?
Para os que gostam de padrões econômicos civilizatórios como referência do gasto público, basta comparar quanto os países desenvolvidos gastam e investem em seus acervos patrimoniais.
Se o controle de inflação é necessário, e é, a defesa do patrimônio e da ciência também. De que vale aquele controle, sem esta defesa?
Desaparece a maior instituição científica brasileira.
Infelizmente, agora está claro. O verdadeiro campeão nacional não é a JBS ou uma empreiteira. O verdadeiro campeão nacional é, ou melhor, era o Museu Nacional. É a Biblioteca Nacional. É o Museu Histórico. O Museu de Belas Artes. É a Cinemateca Brasileira.
É através destas instituições, sempre lembrou Aloísio Magalhães, que participamos da cultura ocidental. Dialogamos e somos iguais aos países desenvolvidos.
Hoje, abandonamos este diálogo. Calamos a nós mesmos. Hoje não somos. Somos participantes da barbárie. Nossos próprios talibãs.
Aloísio, na década de noventa, foi contra a criação do Ministério da Cultura, enquanto a nossa cultura não fosse politicamente forte. Não adiantava, acreditava ele. Premonição?
Existem áreas onde é necessário menos Estado. Sobretudo nas desonerações fiscais, nos subsídios, nos empréstimos subsidiados.
Em outras, ao contrário, é preciso o Estado máximo.
Tem áreas onde o excesso do funcionalismo é desperdício. Mas tem áreas onde o funcionalismo diligente é indispensável.
Trata-se de ver, nas chamas, o Brasil atual. Sem rumo. E autofágico.
Povoado de palavras de ordem, dicotômicas, contra si mesmo.
Capaz de conceder milhões de reais através da Lei Rouanet para shows importados da Broadway, e régios salários para artistas internacionais, em troca de migalhas para o que realmente importa: nós mesmos, em nossa história e em nosso futuro.
Só nos resta Simone: Começar de novo. E contar conosco. Vai valer a pena. Ter acontecido?
*Joaquim Falcão é advogado e escritor, ex-diretor do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e membro da Academia Brasileira de Letras (ABL).
– Texto originalmente publicado no site www.joaquimfalcao.com.br
2 Comentários
E em Itabira? E o Museu do Braz? E o Memorial Drummond? Estes lugares estão a mercê dos Secretários e superintendes, presidentes e sei lá mais que cargos, estão paralisados no pó em suspensão no AR. Nada se faz. Nada se produz. Mas pensando agora, como estas casas de cultura de Itabira são da elite pra elite, talvez tanto faz.
E outro fato que a mim causa estranheza: a vulgaridade no Poço da Água Santa, imposta por um grupo de criminosos (se fez escondido é porque é crime) e ninguém (não se espera nada de justo do judiciário) e ninguém que quero dizer são as pessoas da cidade, os advogados da cidade tão lustradinhos e bundinhas.
No caso do Poço da Água Santa eu acreditei que a cidadania itabirana fosse reagir, mas que nada, ninguém reagiu porque é tudo submisso a MÃE VALE e a famigerada Prefeitura e o prefeito derrotado, inútil, decorativo e enricado…
Vergonhaço. Vergonhaço.
Das décadas que trabalhei com seguro, nunca me cansei de avisar essa falta de cuidados com o património de Itabira.
E o nosso Centro Cultural está na bica de também arder e desaparecer em fumaças.