Mesmo tendo créditos a receber de R$ 250 mil, que corrigidos pelo salário mínimo ultrapassa a casa de R$ 750 mil, e uma dívida de cerca de R$ 80 mil, principalmente trabalhista, a continuidade da Associação de Crédito Popular de Itabira (Banco do Povo) é considerada inviável pelo secretário municipal de Planejamento, Geraldo Rubens Pereira, seu ex-presidente por oito anos (2006/14).
O secretário compareceu nessa quinta-feira (13) na reunião das comissões temáticas, na Câmara Municipal, para explicar a sua gestão frente à instituição de crédito popular. Rubens é acusado pelo atual presidente João Tôrres Moreira Júnior de negligenciar a cobrança dos valores devidos pelos clientes inadimplentes em sua gestão.
Ele nega que isso tenha ocorrido. Os créditos que a instituição tem a receber na praça de Itabira são devidos por 11 tomadores de empréstimos, de um total de 1.046 microempreendedores que recorreram à instituição – e saldaram as suas dívidas.
Para Geraldo Rubens, a instituição deveria ter sido fechada há mais tempo, como sugeriu por diversas vezes quando ainda era presidente. “Quando eu renunciei à presidência, em 2014, deixei R$ 50 mil em caixa. Propus liquidar a instituição, acertando com a funcionária, devolvendo aos instituidores o que sobrasse.”
Entretanto, ele contou que a proposta foi rechaçada pelos conselheiros na mesma assembleia em que deixou o cargo. “Em 1999, quando o banco foi criado, os juros de 3,9% cobrados mensalmente eram atraentes”, recordou.
Consignados
“Com a chegada do crédito consignado, o Banco do Povo ficou inviável cobrando essa taxa de juros e mais a exigência de dois avalistas”, assim ele justificou o seu posicionamento contrário à Prefeitura socorrer mais uma vez a instituição.
Segundo ele, para o Banco do Povo se tornar viável seria necessário fazer um aporte de recursos bem acima dos R$ 150 mil que a instituição pede à Prefeitura para continuar existindo, além de reduzir a taxa de juros.
“O Codecon negou o empréstimo por não ver sustentabilidade no plano de negócios apresentado”, justificou Geraldo Rubens, que é também conselheiro do órgão que delibera sobre os recursos dos royalties do minério destinados á diversificação econômica do município. “A Prefeitura não tem como fazer mais esse aporte de recursos. Como todos sabem, herdamos uma divida astronômica”, repetiu o mantra de sempre.
Bola de neve
Geraldo Rubens criticou, indiretamente, o atual presidente, por ter demorado a demitir a única funcionária da instituição. “Esse valor de R$ 50 mil que o banco tinha em caixa como patrimônio líquido foi consumido com custos fixos, o que na minha opinião, é uma coisa absurda.”
Para ele, não justificava manter a funcionária sem receber o seu salário e benefícios por tanto tempo, mesmo não tendo a instituição dinheiro para emprestar e “recebíveis para correr atrás” de clientes inadimplentes.
“O que ela ficou fazendo esse tempo todo? O banco era para ter sido encerrado antes ou no mínimo, ter feito o acerto com a funcionária para (a dívida) não virar bola de neve”, voltou a defender.
Em sua defesa, João Tôrres argumenta que até mesmo para fazer a liquidação do banco, a Prefeitura como principal instituidora e a única que fez aporte de capital, mais uma vez teria que salvar a instituição. “Fizemos há cerca de um mês a rescisão do contrato de trabalho sem ter como fazer o acerto trabalhista. A decisão agora vai ser com a Justiça do Trabalho.”
O presidente do Banco do Povo também rebateu o argumento de que a Prefeitura não dispõe de recursos para investir na instituição. “O Fundesi tem mais de R$ 4 milhões em caixa. Não tem dinheiro para salvar o Banco do Povo, mas teve R$ 30 mil para o WIN (Workshop de Negócios da Acita) no ano passado, mais R$ 50 mil para este ano, R$ 30 mil para o estacionamento da Unifei e R$ 24 mil para o Clube do Cavalo”, relacionou.
Cobranças
O representante da subseção itabirana da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), João Paulo de Souza Júnior, admitiu que a instituição para continuar existindo teria que mudar o modelo gerencial, mas ressaltou a importância social da instituição de crédito.
“O banco é para socorrer quem não tem emprego e que vai montar uma fábrica de bolo em casa. É um empréstimo para o artesão que quer montar uma banca para vender seus produtos, como muitos fizeram e progrediram”, exemplificou, referindo-se ao público-alvo da agência de microcrédito popular.
“O Codecon só analisou o plano de negócios pelo lado financeiro. Não considerou o papel social do Banco do Povo”, criticou o advogado. “O banco tem uma missão social e histórica que não foi considerada”, enfatizou.
O presidente eleito da OAB, Bernardo Rosa, anunciou que será montada uma força-tarefa formada por advogados para mover ações de cobrança e monitorias contra os 11 tomadores de empréstimos inadimplentes.
“A nossa contribuição será técnica”, disse ele, que representa uma das instituidoras da associação de crédito. “Não vamos participar de sua gestão, mas podemos atuar para receber esses créditos”, disse ele, que também reconhece a importância social do Banco do Povo.
Empreendedorismo
Presente na reunião, a professora aposentada e artesã Graças Reis testemunhou a favor da permanência da instituição. “Recorri por várias vezes a empréstimos no Banco do Povo. Valeu muito em meu negócio”, disse ela, no final da reunião das comissões temáticas na Câmara Municipal.
A artesã itabirana hoje produz sacolas ecológicas e vende em várias cidades do interior de Minas Gerais. “Lamento muito pela situação em que se encontra o Banco do Povo, que por muito tempo ajudou quem precisava e que pagou seus empréstimos em dia.”
Próximos passos
O vereador Reginaldo Santos (PTB), autor do requerimento que convocou o secretário Geraldo Rubens para depor nas comissões temáticas, considerou positivo o confronto ocorrido entre o ex-presidente e o atual presidente do Banco do Povo.
“É assim que a situação vai clareando. O próprio secretário reconheceu que o banco é útil ao povo. Tenho expectativa de que o governo irá rever o seu posicionamento”, disse ele, que acredita no diálogo e no bom senso para encontrar uma saída para a instituição continuar existindo.
Já o vereador André Viana Madeira (Podemos) vê no descaso com o Banco do Povo um retrato do que vem acontecendo em Itabira nos últimos anos. Ele promete, após o recesso legislativo, passar a limpo como andam, historicamente, “”gastando o dinheiro da diversificação econômica para até agora dar em quase nada em relação à independência de Itabira e quanto à geração de empregos.
Madeira voltou a citar os que querem, segundo ele, calar as vozes discordantes da atual administração. “Quando se fala que mamaram durante anos, e que por isso a cidade está acabando, dizem que isso é discurso de pânico”, afirmou.
“Isso é fatura de uma cidade que não investe corretamente na melhoria de vida de seu povo. Itabira tem 24 mil desempregados e corre o risco de ficar sem uma instituição de crédito para salvar quem está à beira da miséria”, protestou.
O vereador também criticou o prefeito por ainda não ter recebido os representantes do Banco do Povo, conforme foi solicitado no início de sua gestão, no ano passado. “Que ele os receba mesmo que seja para dizer um não e servir um café sem açúcar”, recomendou.