Por José Noberto*
Que o município de Itabira possui inúmeros “Griôs”, ninguém duvida. São considerados os guardiões da tradição itabirana, ninguém duvida. Cada um, com sua verdade.A designação, fruto do estrangeirismo de linguagem, aqui no brasileiro, são os nossos Contadores de Histórias.
Temos bons “Contadores de História” no município de Itabira. Uns com características poéticas, outros por vocação artística. Trabalham no exercício de “contar histórias” para públicos específicos, outros, quando são convidados a apresentarem por um projeto cultural.
E tem também os que enveredaram pelo universo da criatividade, abusam da liberdade de criar, adquirida pelos anos de vida e experiência no que faz.
Há outros, ainda, que se tornaram “Memorialistas” pelo conhecimento acumulado e por serem pesquisadores, fatos enriquecedores no desenrolar de qualquer enredo que se queira desenvolver.
Marconi Ferreira é um dos que formam a ala de escritor, pesquisador e contador de história, juntamente com Mário Menezes, Carlos Felipe, Mauro Moura. São também poetas incansáveis, cada um ao seu modo, em suas buscas de histórias que contam os meandros da vida política, cultural e social do município.
Exercício que tem enriquecido o nosso estaleiro de “causos”, com suas meias verdades. Ou verdades por inteiras, ainda que contadas aos poucos.
Nessa linha de bons profissionais, acrescento Eustáquio Liberato, Claudionor Couto, colunista de primeira. Posso citar também o professor Nivaldo Ferreira com seus depoimentos e textos na Interassociação e nos meios sociais, com domínio esplêndido sobre os principais acontecimentos que ocorrem no dia a dia da cidade.
Outro bom contador é o professor Santinho, também escritor, um exímio conhecedor de nossa cultura popular.
Enfim, cada um, com o seu estilo próprio, possui seu público diferenciado, diria até cativo.
Completando a lista, é bom lembrar-se de Rosimeire (dona Rosinha da Interassociação), Eva Gonzaga e Antônio Beato, nomes representativos no nosso cotidiano.
Eva Gonzaga traz um repertório recheado de fatos que exigiram pesquisas para montar textos e projetos para abastecer os seus personagens.
Antônio Beato, no alto de seus mais de 80 anos, é uma grande liderança à frente das Guardas de Marujos. Ele traz no coração, na alma e na mente a história de várias gerações dos “tocadores de caixa com suas vestes, cantigas e costumes“. E assim, por meio de seus atos e memória, preserva os mais de 100 anos de existência desde a primeira Guarda, aqui criada.
O que não faltam são “causos” pra contar. Nas rodas de batuque. Eustáquio Liberato, morador do bairro Vila Amélia, teve um ambiente para lá de inspirador. Afinal a Vila Amélia dividiu espaços com a antiga Vila 105, desativada pela antiga Companhia Vale do Rio Doce.
Ambiente que lhe trouxe boas histórias, fruto da convivência com moradores da Vale e da Acesita (Aços Especiais de Itabira), outra mineradora que marcou época em Itabira e nome de município no Vale do Aço.
Afora esse ambiente, Eustáquio Liberato passou grande parte de sua vivência na Vila Amélia, à frente dos movimentos sociais do bairro, onde liderou o movimento religioso Quadro Vivo da Vida e Morte de Jesus Cristo, que arrastava milhares de pessoas para o acontecimento.
Para concluir, não poderia deixar de escrever sobre os nossos radialistas Mário Menezes e Carlos Felipe, comandantes do programa Viver Itabira, em que o nome já dá o tom da prosa. Recebem convidados para engrossar o caldo dos bate-papos que rendem pérolas que muitas vezes caíram no esquecimento do povo.
Ambos têm trabalhado o ofício de ouvir as pessoas. Aprendem com elas, ouvindo, observando o cotidiano para formar uma boa memória dos fatos antigos ou contemporâneos de nossa história,
Narram com muitas informações, com requintes de sabedoria, cujos trejeitos, e modos de contar uma história, são recheados de detalhes para fazer com que o expectador não disperse.
Peço, contudo, desculpas aos que, por um motivo ou outro, não me lembrei nesse momento em que estou a escrevinhar este texto. De forma nenhuma, eles têm menor significado ou menos importância que os citados.
Mas voltando, ao propósito aqui solicitado, ao qual se refere ao “Castelo do Bongue”, creio que o jornalista, Carlos Cruz, à frente do site Vila de Utopia, soube costurar bem o contexto a que envolve toda essa magia, em torno do “castelo”. Leia também aqui.
Principalmente se observado a época em que foi construído e depois impedido de finalizar a obra, gerando muitas especulações sobre o verdadeiro motivo de tal malvadeza.
No decorrer dos anos, o logradouro foi se tornando um local de mau agouro. Diante da narrativa já bastante trabalhada pelo jornalista, prefiro caminhar por outro viés da minha inserção.
Por isso, não vou me ater a detalhes já esclarecidos. Prefiro navegar fora do enredo, que foi muito bem elaborado e contado pelo Carlos Cruz, com base na narração em prosa do nosso contador de história Marconi Ferreira – e que virou documentário pelas lentes do fotógrafo Fernando Barbosa, que o leitor pode conferir no vídeo aqui.
Durante um período de minha formação, estudei no Coronel José Batista. Era um suplício sair de minha casa e ir para a escola. Se alguém de casa não fosse me acompanhar eu não ia à aula, tanto era o medo de passar naquele lugar assombrado.
O trajeto para o estudante não era de forma nenhuma estimulador. Quando chegava a bifurcação das ruas e beco, era um suplício. Beco do Cascalho, não influenciava muito porque lá eu não entrava.
Na direção do Major Lage, dois aspectos me impedia de por lá passar: um era o cemitério que pegava de um lado a outro e na Martins da Costa além do Cruzeiro, ainda tinha cadeia. E abaixo o tal Castelo, que dava ao local um ar sombrio aos meus olhos de menino.
Passava correndo sem olhar para os lados, cuja história não gostava nem de lembrar.
Quando não tinha ninguém para me levar à escola, saia de casa mais cedo e ia pela Tiradentes que tinha movimento. Por lá eu não tinha que sentir-me amedrontado.
Mas passando ao lado do castelinho seguia sempre com aquela intuição medrosa de que algo de ruim poderia me acontecer. Qualquer vulto ou movimento, a correria desembestada era fatal. Quando findou o ano, nunca mais quis voltar a estudar no Coronel.
Mas o tempo passa. Cresci com medo do Castelinho, que se manteve intocável, silencioso, diria sinistro mesmo, bem no topo da rua do Bongue, sem que surgisse um caçador de fantasmas, para dar ao lugar um ambiente cultural, quem sabe um para se contar essas histórias lá dentro.
Que nada, descendo a escadaria que liga a rua Tiradentes, antiga rua Direita, Tutu Caramujo, olha para cima, bem no alto da “cidade alta” e cisma…
Mal sabe ele que eu corri como um danado quando não tinha ninguém a acompanhar-me. Por causa dessas assombrações, daquele lugar não quero graça, muito menos imaginar que um dia, eu poderia estar a escrever para contar essas histórias que ainda guardo na memória.
E ainda, não se podia imaginar que um fantasma real, da doença que assola o mundo, e que mesmo sendo fatal para muitos brasileiros, houve até quem dela caçoasse, dizendo tratar de uma tal gripezinha que não fazia mal a ninguém.
Com o tempo, o mal-estar não passou. Pelo contrário, alastrou e virou epidemia, para espanto de muitos e o genocídio consumado com a morte de milhares que sucumbiram ao sinistro.
Pois o caso desandou, esparramou, tomou conta e virou pandemia… “é coisa do demônio que não acaba mais. E até parece praga do “Castelinho” que jurou colocar praga para dar trabalho ao mundo para Jesus ter que espantar.
José Norberto “Bitinho” de Jesus é produtor cultural e contador de histórias.