A palavra Novo usada para interesse da política partidária, é um velho conceito oligárquico. Ressuscitado em 2018, consolidou o fascismo no Brasil.
O Novo que começou em 1937, e que foi guardado em 1946, ainda tinha algum sentido de público. Já o Novo atual é privado, é a necropolítica.
Todos os direitos fundamentais da Nação foram tomados pelos Novos fascistas. O povo está vencido, o Novo avança decadente, retrocedente.
E fica a pergunta histórica: o que fazer para derrubar o apartheid de 500 anos?
A seguir, mais um trecho de Maria Julieta entrevista Carlos Drummond de Andrade – gravação disponível no sítio do Instituto Moreira Sales/Rio.
A entrevista foi gravada no verão carioca de 22 de janeiro de 1984. (MCS)
Não fui instrumento do Estado Novo
O meu candidato Getúlio Vargas subiu ao poder e me causou, desde logo, uma grande decepção. Eu tenho sido acusado de ter sido um instrumento do Estado Novo. É uma coisa de que eu não tenho remorso, arrependimento porque não fui instrumento do Estado Novo.
Gustavo Capanema foi ministro do Getúlio Vargas no período constitucional de 34, não era ditadura. O Getúlio tinha sido eleito presidente da República depois de exercer o governo provisório.
Então eu, com a maior pureza do mundo trabalhando com o meu amigo Capanema me sentia à vontade. Quando houve o choque, ele fechou o Congresso, institui a ditadura realmente. Eu podia ter saído, não saí porque o Capanema não saiu, porque o meu vinculo era com ele, Capanema.
E outra coisa mais, o meu trabalho no Ministério nunca foi político. A minha função era estritamente burocrática e junto ao meu ministro. Estabeleceu-se entre nós um acordo tácito. Ele se incumbia do planejamento das grandes reformas que fez e que realmente são hoje marcos históricos na cultura Nacional.
E eu ficava encarregado da burocracia, de encaminhar os processos. A massa de processos dessa natureza era enorme e passava pelas minhas mãos e tinha que ser encaminhada ao presidente da República.
E o nosso ministro que trabalhava dia e noite, sem parar, não trabalhava só papel, trabalhava com a cabeça, trabalhava ruminando projetos, chamando pessoas dos estados e até do exterior para discutir com ele esses problemas.
Ele não podia dar conta daqueles. Então eu fazia. Eu nunca fiz um discurso elogiando o presidente da República, nunca escrevi um artigo, nunca colaborei com as revistas de cultura literária do governo. Eu jamais colaborei.
Então pergunto: qual é o compromisso que eu tinha com a ditadura? Nenhum. Além do mais é uma situação apenas burocrática, que a meu ver tem significação para quem entende o mecanismo burocrático.
Eu não fui nomeado por decreto do Getúlio. Fui designado por uma portaria do ministro. Naquele tempo o chefe de gabinete do ministro era designado por ele e não pelo presidente da República como passou a ser um cargo de função que era cargo de confiança do governo.
Eu tinha cargo, não contava tempo de serviço, eu não tinha ordenado, eu tinha uma gratificação, eu recebia aquilo por verba interna. Não havia vínculo empregatício por assim dizer. Eu podia sair de uma hora para a outra sem direito a nenhuma indenização.
Fiquei lá com ele (Capanema) de 34 até 45, porque ele achava que eu servia bem a ele, e, eu tinha prazer em servir a ele. Era um amigo excepcional, a quem eu estimo, a quem eu venero.
Então eu pergunto, qual era a minha ligação com a ditadura? Procure nos jornais da época, procure qualquer pronunciamento meu a favor. Nada. Pelo contrário, eu até devo dizer, secretamente amargava a minha inconformidade com os rumos da política e ajudava o meu ministro porque era amigo dele.
O Capanema, apesar de ser ligado a essa gente, no fundo ele era um homem de altíssimo espírito público, que procurava fazer sacrifício de ordem pessoal, de ordem política para conseguir realizar as grandes obras que ele imaginava que era o Patrimônio Histórico, como o Instituto do Livro, a nova universidade com os cursos de Letras, os cursos industriais.
Uma série de coisas, o Instituto de Estudos Pedagógicos – um órgão destinado a fazer estudos especiais para que o ensino melhorasse através de métodos pedagógicos novos. Tudo isso que ele fez, eu citei alguns casos.
Ah! o Canto Orfeônico que ele desenvolveu no Brasil, a Educação Física, que ele criou uma divisão só para isso. Um mundo de coisas. Isso exigia papel, processos, exigia burocracia, eu me encarregava disso.
Não tenho menor remorso e jamais aceitaria a designação de ser auxiliar da ditadura. Desafio! Não há alguém que possa provar, pelo contrário.
Aliás não seria infamante que eu fosse: pessoas de maior importância no Brasil trabalharam com o presidente, em cargo de confiança, como o Capanema. O que ele aproveitou daquilo foi construir o edifício do Ministério da Educação, que é um prédio padrão e fazer toda essa série de reformas que caracterizaram o governo, a gestão dele.
Figuras
Carlos Drummond de Andrade
O Meirinho, o Meirão. Um é craque na bola,
o outro, caricaturista. A vontade que sinto
de ter nascido J. Carlos e vencê-lo.
Dos três irmãos Lins, Ivan ainda não conhece
Augusto Comte e já se mostra sábio.
Capanema, o estudante
três vezes estudante, e completo.
O completo vadio,
ignoro se sou. Sei que não sei
estudar, e isto é grave. Jamais aprenderei.
Vou rasgando papéis pelo pátio varrido.
Todos riem baixinho. Volto-me,
pressentimento.
Atrás de mim Padre Piquet vem, passo a passo,
pousa em meu ombro a punição.
(Nova Reunião, volume 3, 3ª edição, Rio de Janeiro/2011)
Carlos Drummond de Andrade (Itabira do Mato Dentro, 31 de outubro de 1902 – Rio de Janeiro, 17 de agosto de 1987)
2 Comentários
É um absurdo comparar oEstado Novo com o Partido Novo, somos liberais e não facistas. Esta conversa não gruda em nós. O caminho para um Brasil grande é o crescimento dos liberais e conservadores. Fora a esquerda que já provou ser incompetente.
Não é absurdo o que penso e sinto e, a história não desmente. E douto modo não me é dado o papel de fazer grudamento ideológicos. E você deve ficar feliz porque o NOVO venceu aqui no Brasil.
E Viva a Esquerda!