No dia 18 de agosto de 1987, em Itabira, houve uma solenidade de saudação e louvação ao poeta Drummond, o que morreu de amor.
A manifestação da poeta Sílvia Lúcia Brandão, no calçadão do Centro Cultural, foi uma poesia de circunstância expressiva entre as pessoas que compartilharam da tristeza. Confira:
Não tem mais rima, o verso acabou – palavra muda pregada na emoção.
Quero um poema para encher a solidão e ocupar o lugar de sua ausência.
Quero sua presença bem no vazio do meu poema.
Meu verso e a dor sentados na mesma pedra – pura tristeza, tristeza pura.
No Pico do Amor, o silêncio conta a história.
Noite itabirana sem Drummond pra contar a poesia.
Nas ruas, o som dos sinos machuca a alma.
Lua, lua, madrugada sem canto, quero os versos de quem me ama.
E assim, no jeito do mundo a vida caminha – vai-vem -, beco sem saída, fim de fio.
Itabira – pedra nos ombros. Nada mais fica inteiro – pedaços de passado, cacos de história e um retrato rasgado ao meio – metade.
Itabira – pedra só – cheia de frio. O lado do coração ficou vazio – o poeta morreu.
Nas ruas de Itabira, a poesia fincou raiz.
Vai Carlos, ser “gauche” no céu! (Silvia Lúcia Brandão)
Leia a seguir mais dois trechos escolhidos de Maria Julieta entrevista Carlos Drummond de Andrade – gravação disponível no sítio do Instituto Moreira Sales/Rio. A entrevista foi gravada no verão carioca de 22 de janeiro de 1984. (MCS)
Vida
Fui muito bem servido pela vida
A minha vida foi feita ao sabor do acaso à minha revelia, por assim dizer. Eu me adaptei à vida que me impuseram, que me traçaram. É verdade que eu, contribui pouco para modelar a minha vida. Eu não estudei praticamente, essa é a verdade.
Eu fico muito espantado quando as pessoas falam dos meus conhecimentos, das minhas sabedorias. Não tem nada disso, isso é uma palhaçada, uma patuscada. Eu não estudei, fui muito vadio, muito displicente com relação a formação de uma carreira, o projeto arquitetônico de uma vida, não tive nada disso.
Até que eu não me queixo, pelo contrário, fui muito bem servido pela vida. Nesse sentido sou um homem feliz, porque eu não fiz força para viver, eu não sofri grandes traumas na vida.
Morte
Morremos de verdade, morremos mortos
A única coisa de que eu estou convencido é de que nós morremos de verdade, morremos mortos. A essência humana desaparece, se ela se converte em cinzas, em adubo, em qualquer coisa não é mais humano.
Vamos convir que o homem não é assim tão importante. Aí vem o problema da morte. Eu acho que a aceitação da morte é o máximo que o ser pode conseguir para efeito de se ajustar com a vida, de se entender com a natureza.
Se o exemplo é de que todas as coisas são mortais, todos os seres são mortais, o homem não pode pretender essa imortalidade, me parece uma grande pretensão. Ele se consola com a ideia de imortalidade, ele se consola da sua imortalidade, mas ele não tem nenhuma prova de que existe esta imortalidade.
Carlos Drummond de Andrade (Itabira do Mato Dentro, 31 de outubro de 1902 – Rio de Janeiro, 17 de agosto de 1987)