Mauro Andrade Moura
Passados os trezentos anos do início da colonização do território de Itabira, muito há por nos contar as pedras, as cavas, bem como as fotografias que nos remontam ao passado.
Por exemplo, o monumental, portentoso, pico do Cauê, que guiou os antigos povoadores até o Córrego do Rosário e suas faíscas de ouro. Eram os Irmãos Albernaz que puxavam a fila de algumas famílias, dentre elas o casal Alvarenga Andrade (Elias Correia de Alvarenga e Mécias Lemes de Andrade).
Nessas idas e vindas, Salvador Faria de Albernaz tornou-se um pobre coitado, pois caiu nas garras da santa inquisição católica. E, das antigas glórias, restou a esse judeu sefaradita a tristeza da miséria e a morte como um pobre moribundo.
Deste início lento, mas constante, o arraial foi crescendo na beira do córrego do Rosário, alguns extraiam lá seu sustento, outros mantinham fazendas de gado a alimentar a Vila Nova da Rainha, o Morro Grande, a Vila Rica; sendo que lá todos só tinham olhos voltados ao que reluzia.
Na segunda geração dos primeiros, a busca constante ao que se tinha como certo, o ouro em abundância, chegaram às lavras da Conceição. Foi uma pequena corrida ao ouro fácil.
Estavam lá para garantir seu termo João Francisco Andrade e seu cunhado Francisco da Costa Lage, acompanhados posteriormente de Ângelo Custódio de Meneses. Era a primeira feitoria registrada, era a Sociedade Velha em 1790. Para manter o registro, tinha-se de ter grande cabedal de recursos, seja em dinheiro ou em bens.
Nesta busca que parecia infinda, sabemos hoje, tornou-se finda, caminharam pela Serra do Espinhaço, iam de cata em cata, melhor dizendo, de sarrilho em sarrilho.
Eram tantas as catas que temos uma conta básica, 105 a dar o nome à Vila. Surgiu a Camarinha, hoje mal dita como mina do meio. Retornaram ao Cauê até a mina de Sant´Ana, era a Sociedade Nova.
É o legado do ouro para nossa Itabira, para o Quadrilátero Ferrífero. Afinal, a criação de Minas Gerais é visível e sentido.Todo um casario que formava o pequeno centro urbano de Itabira do Mato Dentro.
Diferentemente do casario de Ouro Preto, os daqui tem uma estrutura assobradada, são mais volumosos e com grandes quintais, afinal de contas as famílias tinham muitos filhos.
Desse antigo casario, boa parte se perdeu. Foi vencida pela especulação imobiliária pós-guerra e com a abertura da mineração de ferro.
Da época do ouro, herdamos o sentimento próprio de ser-se itabirano, com muito gosto, bem como o modo de expressarmos ao ponto da criação de uma língua própria, a Guinlagem de Camaco. Esse “dialeto” servia como meio de comunicação.
Hoje, quase desaparecida, segue utilizada como mera lembrança ou por brincadeiras ocasionais. Mas já tratou de muitos assuntos sérios em Itabira do Mato Dentro, de modo que os ingleses não entendessem do palavreado dos mineiros da terra.
A primeira fundição de ferro foi capitaneada pelo Major Paulo de Sousa, com a abertura promovida por D. João VI, em 1815. Já em 1816, tínhamos as forjas do Girau. A partir dessa, muitas outras foram surgindo, pequenas ou médias, todas buscando aproveitar o grande volume de minério de ferro em todo o território.
As armas, com os capitães assinalados, do Girau seguiram a serviço na Guerra do Paraguai. Participaram do genocídio brasileiro em terras paraguaias.
Outros tempos, outras necessidades. Surgem também as selarias, tantos seleiros eram a ocupar toda uma rua, a Rua Daniel de Grisolia.
As tropas, os tropeiros levando o ferro batido, os arreios, e buscando o ferro acabado, o sal, a notícia da cidade grande, da metrópole.
O prenúncio do fim, os visionários capitalizados. Surgem as fábricas de tecidos. Grandes sesmarias, muitos escravos, de repente, já não eram mais escravos. Uma multidão, uma cidade mediana, eram 4.000 almas, havia de ter serviço para o sustento de todos.
Chegávamos ao limiar de um tempo, surgia a república com suas promessas vans. Hoje, chamamos de República Velha com seus vícios. Esses, porém, seguem nesta república que já nem nome tem, tantas foram.
Nesse percurso, uma guerra dalém mar e vem de lá a espanhola. Daqui ninguém foi, muitos sobreviveram e alguns morreram com aquela gripe implacável, aterradora.
O café, tantos terreiros, as tropas encaminhando à ferrovia distante. Abre-se a estrada de Capoeirana com o enxadão ou o picão de nossas próprias forjas. A quebra, a desilusão, grande perda, grande evasão dos que precisavam continuar sua sina, sua vida d’além serras.
A grande guerra. O mundo todo voltado para um único objetivo: liquidar o fascismo, destruir os nazistas.
Chega a ferrovia, abre-se a mina de ferro, toma-se toda a mão de obra local, para que o minério fosse praticamente arrancado na unha. O Cauê se esvai na sua exuberância. Daí mais algumas décadas, o maior trem do mundo levaria todo ele para a Alemanha, para o Japão…
As fazendas. Eram grandes fazendas, ô desilusão. Era tudo, sem a mão de obra, passou a ser nada. Valia a mata, a terra era o meio.
As fábricas, tantas fábricas, cadê, meras notícias mal ditas, malditas, perdidas em seu tempo.
O legado do ferro?
Ah, uma grande cidade interiorana, ainda provinciana, não consegue encontrar seu rumo. É o descaminho.
Do antigo legado cultural, quase nada se percebe, tal o aculturamento com as grandes vindas populacionais a suprir a necessidade da mineradora.
Dizem a respeito do grande potencial turístico. Sim, pode ser, mas este ainda não se apresentou, não ultrapassou as montanhas, as serras.
Uma cidade sempre mal gerida com ruas quase sempre esburacadas, mal remendadas e calçadas esfaceladas.
As antigas histórias, hoje foram transformadas em meras estórias.
O que apresentar? Nesse viés, nada a apresentar.
Se Itabira é apenas um retrato na parede, como dói…
4 Comentários
Muito bom, esclarecedor e histórico!
Norberto
Salve Salve… Bela matéria!
Parabéns primo!
Ótimo artigo.
Saudações,
Luiz
Em que ano foi o simulado?