Carlos Cruz*
Após ter ocorrido uma reunião extraordinária em janeiro, em pleno recesso legislativo, quando os vereadores aprovaram por unanimidade os projetos do executivo autorizando ao prefeito contrair mais empréstimos para dar continuidade às obras da polêmica avenida Machado de Assis, além da doação de imóveis para a construção de 400 apartamentos populares, esperava-se uma reunião mais produtiva nessa terça-feira (07/02).
Mas o que se ouviu foi muito blá-blá-blá, um verdadeiro palanque eleitoral. Os vereadores aproveitaram que a sessão é transmitida por duas emissoras de rádio para se dirigirem às suas bases eleitorais, deitando falação sobre propostas e algumas poucas cobranças.
Para justificar a reunião, que é paga pelo contribuinte, foram apresentadas mais de 50 indicações, todas inócuas (os vereadores querem, por exemplo, destinar um espaço público – área verde? – para o Jeep Clube de Itabira). Inócuas e eleitoreiras, uma vez que as indicações não têm força de lei, podendo ser acatadas ou não pelo prefeito.
Entretanto, para os ouvidos incautos de presumíveis eleitores soam como dádivas dos edis. Com esse propósito, foram fartas as indicações para que sejam colocadas placas de sinalização em avenidas (ainda que elas sejam importantes, pois realmente a cidade é muito mal sinalizada, mas isso, há de se convir, deve ser iniciativa dos responsáveis pelo trânsito, que são pagos para isso).
Mas nenhum projeto de lei foi apresentado, seja de autoria do prefeito Ronaldo Magalhães (PTB) ou dos próprios vereadores. Com tantas leis municipais existentes no município com artigos precisando de urgente regulamentação, não teria sido o caso de os vereadores aproveitarem o recesso para analisar as pendências legislativas e apresentar projetos para esse fim de regulamentar o que ainda não está posto devidamente em lei?
Por exemplo, o Plano Diretor de Saneamento Básico se encontra em muitos aspectos inoperante justamente por depender de artigos que ainda não foram regulamentados. É o que ocorre também com o Plano Diretor de Áreas Verdes, o que ficou evidente com o corte indiscriminado de árvores pela já abandonada operação Cidade Limpa. Nada disso foi apresentado, sequer cogitado.
Palanque eleitoral permanente
Já o palanque eleitoral consumiu quase todo o tempo da reunião. É verdade, pode-se argumentar, que alguns temas abordados são de importância para moradores dos bairros ou para os distritos, como é o caso dos deslizamentos de terra que têm ocorrido com as chuvas em vários bairros. Isso sempre afeta dramaticamente a população de bairros sem infraestrutura, com casas construídas em encostas onde nunca deviam terem sido edificadas.
Ou ainda, há que se falar das estradas vicinais dos distritos de Senhora do Carmo e Ipoema, que estão intransitadas principalmente depois que a patrol da Prefeitura fez serviço em momento impróprio, quando ainda as chuvas caem torrencialmente. Isso, é verdade, provoca transtornos muitas vezes insanáveis e prejuízos aos moradores, assim como prejudica o turismo na região. Mas há de convir, é tema para ser tratado diretamente com a Secretaria responsável pelo serviço.
Os vereadores elogiaram a vinda do Colégio Tiradentes para Itabira, como se fosse a panaceia para o ensino fundamental, com base na disciplina militar. Outro vereador quer que o presidente do Valério compareça à Câmara para discorrer sobre a eterna crise que o time vive, há vários anos sem disputar a primeira divisão do campeonato mineiro. Tudo, bem é um tema que merece ser debatido.
É verdade também que os vereadores se queixaram do eterno abandono do município pelo Estado, tendo a Prefeitura que assumir compromissos – como o de ceder funcionários para a delegacia de polícia emitir carteiras de identidade – e que não são obrigações municipais. Um abandono que é secular, e que nunca se resolve por falta de força política. E não serão os vereadores que irão resolver.
Temas urgentes
Nem um pio foi dado sobre a crise na Unifei, desencadeada com a renúncia do diretor e diretor-adjunto do campus local. É verdade que a crise interna não é da alçada dos edis. Mas o investimento que o município já fez, da ordem de R$ 63 milhões, é suficiente para que os olhos e o dever de fiscalizar dos vereadores se voltem para a questão.
Isso, principalmente depois que o reitor Dagoberto de Almeida se mostrou reticente, em seu recente pronunciamento no site da instituição, sobre um novo modelo de universidade a ser implantado em Itabira, como forma de contribuir para a diversificação econômica do município.
O seu pronunciamento coloca em dúvida esse propósito de o município se transformar em um polo tecnológico. É verdade, registre-se, que uma Comissão Especial de Estudo deve ser instalada na Câmara neste ano para debater essa pauta tão primordial, que é o tão sonhado projeto universitário de Itabira – e que tem na Unifei o seu carro-chefe.
Outro tema igualmente importante para o desenvolvimento sustentável de Itabira, que ainda não foi devidamente debatido pelos vereadores, trata-se da questão da inadimplência de empresários que devem somas vultosas ao Fundo Municipal de Desenvolvimento Econômico (Fundesi). Dívidas essas que, devidamente corrigidas, devem ultrapassar a cifra de R$ 9 milhões. E que podem, em boa parte, ter sido prescritas por omissão e prevaricação dos gestores desse fundo.
Bala na agulha
Especula-se que os vereadores estejam guardando “bala na agulha” para quando o carnaval passar. Nesse sentido, por exemplo, é também verdade que a Câmara deve realizar uma audiência pública para tratar de um tema historicamente controverso, que é o monopólio do transporte coletivo urbano na cidade, assim como os preços abusivos das passagens.
O presidente Neidson Freitas (PP) anunciou que serão realizadas várias audiências públicas na Câmara neste ano, por iniciativas dos vereadores. “Queremos ter um ano legislativo atuante, com muitos debates e encaminhamento de ações de interesse da comunidade.”
Espera-se que seja verdade, até mesmo para se desfazer essa má impressão que fica da primeira sessão legislativa do ano. Afinal, fortalecer o papel do legislativo é uma forma de preservar a democracia.
Sem um legislativo atuante, firme, independente e fiscalizador, como historicamente tem sido, o que impera é o autoritarismo do executivo, que faz o que bem entende, como ocorreu com o corte indiscriminado de árvores e a desafetação de áreas verdes em uma cidade carente de arborização.
Com a instalação do Observatório Social de Itabira, uma organização da sociedade civil, espera-se que o monitoramento do trabalho do legislativo possa ser traduzido em ações mais eficazes de fiscalização e legislação por parte dos parlamentares.
Sem isso, os vereadores não passam de despachantes de luxo de seus eleitores. O que é muito pouco – e isso acaba aviltando a ação legislativa, dando margem para que forças obscuras projetem a volta da ditadura.
2 Comentários
Parabéns Carlos Cruz pela matéria mostrando a ineficiência do legislativo.
É preocupante o contexto da Unifei – universidade federal de Itabira, que funciona mais com uma base de apoio federal da cidade matriz, pois, todo o aparato que aqui é alicerçado tem, como base, os interesses da matriz.
Nesse sentido, o investimento que para aqui são endereçados chega aos cofres deste município ou é direcionado para matriz que irá discutir se repassa ou não o valor destinado.
Comenta-se a boca pequena, que os equipamentos destinados ao Campus de Itabira foram redirecionados a universidade matriz, desfalcando a universidade local de taís equipamentos, sendo, pois, necessário a vereança acompanhar de perto e convocar o ex.reitor para explicitar com riquezas de detalhe o real motivo de sua demissão.